O ser humano é um ente psicossomático dotado de intelecto e sentimentos quanto a matéria corporal, mas também é um ser espiritual quanto a natureza da alma que ativa, e dá vida ao corpo.
Pela razão é que ele obtém o domínio sobre todos os sentidos, discernindo entre a nocividade e a bonança.
Já pela espiritualidade lhe é permitido ver-se como fragmento Divino, dotado da imagem e semelhança de Deus, para interagir com o Criador, mediante os canais que Ele nos disponibilizou:
“Deus criou o homem à sua imagem; criou-o à imagem de Deus, criou o homem e a mulher. (Gênesis 1. 27) ”
No entanto, somente a alma fora criada imortal:
https://magisteriotradicaoescrituras.com/2018/09/27/da-imortalidade-da-alma/
Não tinha o primeiro casal, Adão e Eva, a imortalidade definitiva do corpo quando no Paraíso, o que seria restaurado, após o pecado, na ressurreição corporal dos seus descendentes, salvos no sacrifício de Cristo.
O gênero humano não tem a imortalidade CORPORAL por natureza.
A matéria criada detém princípio, meio e fim pela ação do tempo.
Por causa da dinâmica temporal, é que toda matéria se sujeitou a deterioração, conforme explica a física quântica.
https://magisteriotradicaoescrituras.com/2018/07/12/da-existencia-de-deus-pela-via-do-movimento/
Sabemos que o tempo está inserido no âmbito da obra Divina criada, nascendo da divisão dos dias e noites:
“Deus viu que a luz era boa, e separou a luz das trevas. Deus chamou à luz DIA, e às trevas NOITE. Sobreveio a tarde e depois a manhã: foi o primeiro dia. (Gênesis 1. 4 e 5) ”
É certo ainda que no Paraíso, estando o homem em inocência, embora houvesse o tempo, não havia por intervenção Divina a ação deste tempo na matéria, até o momento em que nossos primeiros pais, sendo infiéis, pecaram.
Mas se não havia o efeito do tempo na matéria, sendo o gênero humano em sua completude imortal neste estado, por que precisou a Adão e Eva, Deus lhes dar alimentos?
Como haveria de ter UM CORPO IMORTAL, quem se sustentava de alimento?
Ora, sabe-se que todo corpo animado tem necessidade da alimentação para se recompor das energias perdidas em sua atividade de movimento.
É sabido ainda que a ausência de alimentação lhe causará perda da fonte energética, minguando e depreciando até a morte e extinção.
Daí a questão que pertine:
Estando IMORTAIS, poderiam Adão e Eva, em estado de beatitude virem à óbito, caso se negassem aos alimentos ofertados por Deus?
Pela Tradição Apostólica e pelas Escrituras, a resposta é SIM.
Poderiam morrer fisicamente.
Adão e Eva neste caso, morreriam, mas não das causas naturais que conhecemos hoje, como resultado da fome e inanição.
A morte lhes adviria pelo pecado da desobediência e da quebra de um PRECEITO DIVINO.
Foi dito por DEUS, não apenas que nossos primeiros pais não comessem do fruto da “Árvore da ciência do Bem e do mal, ” mas que também comessem, e usufruíssem de todos os demais frutos das outras árvores existentes no Jardim do Éden:
“Deu-lhe ESTE PRECEITO: “Podes comer do fruto de todas as árvores do jardim; mas não comas do fruto da árvore da ciência do bem e do mal; porque no dia em que dele comeres, morrerás indubitavelmente. (Gênesis 2. 16 e 17) ”
O termo “podes comer” no aramaico “aw akal” (ן אָכֹ֥ל תֹּאכֵֽל׃) não implica apenas numa ação opcional, mas possibilidade de comer livremente, sem proibição.
Poder, no sentido de que lhe é outorgado enquanto um direito a ser exercido, e lhe é permitido exercer livremente.
Já a palavra “PRECEITO” no hebraico “tsavah” ( צָוָה), implica COMANDO, ORDEM, MANDAMENTO, obrigação impositiva, não facultativa.
Adão e Eva, caso não se alimentassem, não morreriam por fome ou inanição, mas pelo PECADO DA DESOBEDIÊNCIA, perdendo o domínio e reinado sobre as coisas criadas:
“[…] a DESOBEDIÊNCIA é como o pecado de idolatria. Pois que rejeitaste a palavra do Senhor, TAMBÉM ELE TE REJEITA E TE DESPOJA DA REALEZA! ” (I Samuel 15, 23)
“Façamos o homem à nossa imagem e semelhança. Que ele REINE sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus, sobre os animais domésticos e sobre toda a terra, e sobre todos os répteis que se arrastem sobre a terra. ” (Gênesis 1. 26)
O ato de Deus ofertar alimentos a Adão e Eva, se entende como manifestação da bondade, estima, afeto e amor de Deus para com os seres humanos, dando-lhes o que havia de melhor, de mais saboroso e aprazível na criação, como demonstração de seu SUBLIME AMOR a raça humana.
Em contrapartida, é natural do ser humano ordenar-se por necessidade ou deleite a tudo aquilo que Deus oferta.
Deixando de comer, negavam-se à oferta do próprio AMOR DE DEUS, desprezando sua oferenda de afeto e comunhão.
Assim como era pecado comer do fruto proibido, igualmente seria pecado repudiar os frutos bons, dados por Deus, numa prefiguração em relação ao pecado (fruto ruim) e santidade (fruto bom), e simultaneamente uma projeção profética em relação a Eucaristia.
Sobre isso, lecionou Santo Tomás de Aquino:
“SE O HOMEM NÃO BUSCASSE O ALIMENTO PARA SI, PECARIA; ASSIM COMO PECOU TOMANDO O ALIMENTO PROIBIDO. (Suma Teológica, Q 97. art. 3º – Do Estado do Primeiro Homem Quanto a Conservação, Livro Ia) ”
Deus, por Amor, fez-se “garçom” da raça humana no Paraíso.
Se hoje, os alimentos são necessários para a vida do corpo, no estado de inocência dos primeiros humanos, antes da queda, se faziam necessários a manifestação da obediência para comunhão no Amor Divino.
Por esta razão, ainda que preservados na imortalidade, Adão e Eva deveriam tomar alimentos ofertados por Deus.